Corça de Cerineia


 

Diz-se que a ninfa Taígete, para fugir do assédio implacável de Zeus, foi transformada pela deusa Ártemis numa enorme corça (maior que um touro) com chifres de ouro maciço polido e pés de bronze, que corria com assombrosa rapidez e nunca se cansava. A sua velocidade era tamanha que era capaz de ultrapassar uma flecha e até mesmo conseguiu escapar da própria deusa, quando esta capturou um rebanho de cervos para puxar a sua carruagem. Após essa fuga, Hera conduziu a corça para o Monte Cerineia.

Euristeu conferiu a captura da corça como terceiro trabalho para Hércules, porque sabia que a corça era propriedade sagrada de Ártemis e Hera e isso colocaria o herói contra as deusas. Existem duas versões desta tarefa, que levou um ano para ser realizada e percorreu uma larga extensão de terra até os Hiperbóreos:
Hércules perseguiu-a incansavelmente sem nunca alcançá-la, até que, exausta, a corça parou para beber água e foi ferida levemente por uma das flechas do herói.
O herói preparou uma armadilha no Templo de Ártemis com uma rede para não a magoar.

No caminho de volta a Micenas com a corça nos ombros, Hércules encontrou Apolo e Ártemis, furiosa, que o acusou de sacrilégio sentenciando-o á morte. O herói contou aos gémeos divinos a razão da captura e o seu juramento ao rei Euristeu. A compadecida deusa curou, então, a corça e permitiu que ele levasse o animal sagrado com a condição de que ela fosse libertada logo após que o rei a visse. Euristeu decidiu ficar com a corça, no momento que colocou os olhos nela, mas Hércules não podia permitir. Ele disse para o rei a ir buscar e soltou-a, ela correu de volta para o templo da deusa.

A simbologia da corça apresenta dois aspetos de interpretação: por ser consagrada a Ártemis carregava pureza e virgindade acentuadamente, mas o bronze nos seus pés poderia pervertê-la, fazendo-a apegar-se a desejos terrenos. O metal isolava o animal do mundo profano, mas, ao mesmo tempo, impedia-a a voos mais altos. Os seus chifres de ouro representavam a força da alma, um vigor capaz de preservá-la de qualquer fraqueza espiritual. É como se toda a dificuldade na execução do trabalho fosse necessário usar uma estratégia delicada para lidar com a sensibilidade ambígua inerente ao indivíduo.

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